quinta-feira, 20 de maio de 2010

Contra os “Frankensteins”: a Bioética

Prof. Dr. Marcelo Pelizzoli

Nas últimas décadas, as nossas cidades, o estilo de vida, o consumo e a forma de se relacionar com as coisas e a vida mudou dramaticamente. A tecnociência criou um fascínio por coisas novas que se podem usar e abusar. Veio uma avalanche de equipamentos, aditivos químicos (na alimentação: de 50 para 500, em 40 anos), celulares, eletrônicos, inseticidas, refrigerantes, pilhas, agrotóxicos, enlatados, carros, pneus (900 milhões por ano) peças de todo tipo, eletrodomésticos, coisas sem fim... Enquanto um indígena yanomami precisa de menos de 70 tipos de utensílios para toda sua vida, o homem urbano de elite pode chegar a 7.000 ! Ao lado disso, montanhas de LIXO, poluição, degradação ecológica, ataques à qualidade de vida etc.
Na área da Saúde e Ambiente, vemos as mudanças mais surpreendentes. Tínhamos a questão do aborto e da eutanásia, mas agora é muito mais: bebês de proveta (laboratório), bancos de sêmen de pais mortos, clonagem de animais, pesquisas com embriões e partes dos seres vivos; o ponto alto: manipulação genética – alterar o cerne biológico do corpo, o código genético de plantas e animais (incluindo o ser humano). Daí os ameaçadores transgênicos, tecnologia de cultivos que tem pouquíssimos donos no mundo, é cara e prejudica o pequeno agricultor (a economia dos países fracos) e os cultivos tradicionais/naturais, sem falar na saúde do consumidor.
Nos anos 60, filósofos, ativistas, ecologistas, e alguns cientistas começaram a denunciar os efeitos negativos da técnica unida com a ciência, que alimenta o modelo capitalista explorador e sua sociedade de consumo infinito, que degrada a vida humana e natural. Eles começaram a criar uma nova visão, sensibilidade e ação, uma contracultura. Defendem os direitos humanos, os direitos do paciente, dos animais, da natureza, dos pobres, das mulheres oprimidas, dos fracos, e pregam um modo de vida ético, ecológico e verdadeiramente humano. Neste contexto é que surgiu a BIOÉTICA, a ética da defesa da Vida, da essência humana, da saúde equilibrada, do modo de vida comedido e simples, dos movimentos alternativos, tudo isso contra os abusos dos “Frankensteins”. Este é um ser parte monstro parte homem, uma aberração/deformação criada por um cientista, numa experiência planejada mas inesperada. Hoje, médicos, químicos, pesquisadores, industriais, agentes de laboratório e até professores criam essas criaturas quando: nos envenenam com excesso de medicamentos, alimentos quimificados e industrializados, aditivos artificiais, inseticidas, descartáveis, pilhas, equipamentos de todo tipo, um monte de supérfluos, gastos de água e energia desmedidos, automóveis etc. E até a carne (a pecuária destrói as matas, o boi produz metano que é um dos gases do efeito estufa – aquecimento global – produz doenças como o câncer, cardíacas e muitas outras, ele toma o espaço de áreas que poderiam ter grãos e vegetais, o boi é tratado com crueldade, existem 190 milhões de bois no Brasil !).
A Bioética ficou mais conhecida na área da Saúde por lutar contra as experiências cruéis e fatais feitas com milhares de seres humanos com as pesquisas médicas, tal como se faz com ratos. Também pelo tratamento desumano de muitos médicos técnicos frios. Mas na origem do termo, criado por R. Potter, ela é a crítica da tecnociência em nome da ética, e a busca de um mundo que respeita a Vida acima de tudo, uma ética planetária. É um olhar, uma consciência, uma sensibilidade e depois uma Ação, por vezes barulhenta, outras silenciosa, que está tentando fazer a humanidade caminhar para o tempo ecológico, da defesa da natureza, dos direitos humanos, dos movimentos alternativos, medicina natural e agroecologia, por exemplo.
A Bioética, na Saúde, criou centenas de Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) nas universidades e centros de pesquisa, que procuram controlar as pesquisas com seres humanos para evitar abusos antiéticos. Porém, isso é um pequeno passo. O passo maior é quando nós, povo, vamos atrás das informações, e chegamos até a consciência crítica e a sensibilidade de ser tocado pela violência: a degradação social (riqueza X pobreza) e ambiental (consumo e capitalismo X equilíbrio e socialização), e então decidimos agir: boicotar o antiecológico e o consumo degradante e as corporações que só pensam no lucro, e optar conscientemente pelo simples, pelo menos, pelo orgânico, pelo ecológico, pela cidadania, pelo espiritual, enfim, pela Vida em todas as suas formas. Mas, até onde você consegue evitar os “frankensteins” e agir de modo (bio)ético ? Muito disso depende de você, pois estamos no período de transição do anti-ecológico para o olhar ou “paradigma ecológico”.
São apenas algumas questões bioéticas, que evocam não apenas os imensos desafios que nos esperam, mas revelam o atual espírito do tempo, de um prisma inadiável para a humanidade, postura de defesa socioambiental, um paradigma pautado mais na ética do que no lucro, uma verdadeira racionalidade BIO-ÉTICA.

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